O colo da mãe certamente é o céu na Terra para a criança, mas ele não pode ser o único local onde ela se sinta segura em estar. A orientação da criança é feita a partir de seu centro, representado pelo seu próprio corpo. As vivências com corpo trazem habilidades e orientações espaciais e geram calma interior, somente a partir desse tipo de vivência ela, então, será capaz de concentrar-se em alguma tarefa que exija horas sentada, por exemplo. Este processo é uma construção gradual.
O brincar necessita de algumas condições para que se realize, condições fornecidas pelos adultos. Quanto menor a criança, mais aconchegante deve ser o seu ambiente; para quem acaba de chegar de um útero apertadinho e com paredes bem delimitadas, um ambiente demasiadamente amplo pode ser hostil. O espaço deve permitir que ela se movimente, de acordo com sua idade. Os limites não são apenas físicos, a maneira como utilizamos o espaço, a quantidade de brinquedos, tudo isso está envolvido para que a criança possa entrar em contato consigo mesma.
Podemos, inclusive, começar a ensinar ecologia às crianças sem explicações conceituais, partindo desse ambiente do brincar. Os tipos de brinquedos, de preferência feitos de elementos da natureza, como lã, seda, algodão, madeira, pedras, pedaços de madeira, materiais com os quais ela possa criar, colocando um pouco de si, e transformar. O desperdício, de certa forma, demonstra falta de cuidado, tudo que descartamos, a maneira como o fazemos, pode, desde cedo, trazer a ideia de que algo não pode ser recuperado.
Organizar os materiais em cestos separados facilita que a criança processe as informações e se organize para começar a fantasia. Limpeza também é importante, mas não garante o essencial, o calor. O calor expande, transforma, aquece, simplesmente nos envolve. O calor vem do sol, da comida que cai na barriga, dos relacionamentos e, principalmente do entusiasmo. Entusiasmo que o adulto pode mostrar por meio do amor pela tarefa de cuidar da casa, cozinhar e, principalmente, pelo gesto de cuidar da própria criança. Este calor faz, de qualquer ambiente, um local verdadeiramente aconchegante.
A criança também precisa de tempo: para decidir do que brincar, onde quer chegar, tempo para experimentar, errar, acertar…a pressa do cotidiano, as agendas infantis carregadas, fazendo das crianças pequenos executivos, faz restar pouco tempo para a tarefa mais importante da criança: brincar. Também, estão sendo exigidos conhecimentos e habilidades precoces, em detrimento de aspectos fundamentais do desenvolvimento infantil, que podem converter-se em sintomas como ansiedade, medo, insegurança, entre outros.
A relação com a natureza faz parte do brincar, nesta hora, muitos se perguntam se é necessário um grande espaço para isso, levando em conta de que há um número cada vez maior de famílias vivendo em apartamentos. Ouvi o depoimento de uma educadora, em entrevista para a Mercúrio Antroposofia em 2020, sobre uma criança que se relacionava com a natureza olhando o céu, de seu apartamento sem varanda. Os dias chuvosos, de sol, a alternância da luz que incidia na sala, todos esses elementos eram trazidos à atenção pela mãe e valorizados, criando nesta menina uma relação tão próxima com o céu quanto a da criança que vive no campo. É esta simplicidade que precisamos buscar com nossas crianças. O adulto que se dispõe, com amor e entusiasmo, terá a sensibilidade de enxergar o que sua criança precisa.
Cada criança é única e carrega consigo algo que precisa ser ativado, e o adulto que se coloca neste caminho, com a disposição de alma, saberá encontrar aquilo que precisa oferecer.
Referência bibliográfica
LAMEIRÃO, Luiza. Criança Brincando! Quem a educa? Ed. João de Barro
Comente, queremos ouvir você.
Acreditamos que a troca é fundamental para evolução da nossa consciência.
O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *