Parentalidade

Devo tirar os eletrônicos do meu filho?

Tempo de leitura: 6 min

Uma escrita, muitas formas de consumi-la.

Devo tirar os eletrônicos do meu filho?
Eu leio para você…

Por Camila Cassia Capel

Vivemos em uma era digital e a preocupação de preparar nossos filhos para este mundo leva muitos pais a incentivarem o uso de eletrônicos. Mas alguns deles começam a se preocupar com os resultados do uso excessivo das telas e dos eletrônicos. Diante dos casos clínicos reportados, já teríamos motivos para abolir os eletrônicos da infância, mas sabemos que eliminar as telas do dia a dia pode ser motivo de muito esforço e brigas. A pedagogia Waldorf tem a clara visão da necessidade de manter as crianças longe das telas, em consonância com as recomendações de autoridades médicas, como a Sociedade Brasileira de Pediatria, que indica que crianças menores de 2 anos não sejam expostas a elas e que aquelas entre dois e cinco anos, fiquem no máximo uma hora por dia. 

A decisão, que impacta na vida familiar, deve ser tomada pelos responsáveis em conjunto, pois a falta de coesão pode gerar pontos de conflitos, disputas, manipulação e, consequentemente, muita insegurança por parte da criança. É preciso entender que uma decisão dessas altera a rotina da vida da família, porque todo não para alguma coisa, significa sim para outra. Sem eletrônicos a criança passará por uma fase de adaptação e os longos discursos explicativos dos pais, de nada adiantarão para sua compreensão. De acordo com a faixa etária, cabe uma conversa rápida e ação! A criança do primeiro setênio está ligada ao agir do adulto e não à suas falas. 

A maior dificuldade dos pais que optam por eliminar as telas é lidar com sua própria ansiedade e angústia diante da privação da fonte de prazer dos filhos, neste caso, as telas. Os pais também carregam memórias afetivas com relação à TV, por isso, às vezes fica difícil abolir algo que tem conotação e memórias afetivas tão agradáveis. Devemos, antes de, efetivamente, agir, trabalhar esses aspectos em nós, para que nos sintamos seguros para falar a partir deste lugar de autoridade. Vale lembrar que a criança percebe as emoções que se escondem atrás das palavras.

Resolvida esta questão, o desafio é lidar com uma criança mais chorosa, nervosa, frustrada e entediada. O tédio – presente na vida de toda criança saudável – não era percebido, pois as telas entravam nesta lacuna. Faz parte da função de quem estabeleceu a nova regra, buscar soluções para compensação, como brincar ao ar livre, brincadeiras de movimento, contato com natureza; enfim, estimular a criatividade, a fantasia e o brincar livre, tão em falta na agenda das crianças hoje em dia.

Conversa feita, ação efetivada, atividades proporcionadas, agora vem o mais difícil: a coerência entre o que se busca é o que se faz! Se os pais são excessivamente ligados aos dispositivos digitais, fica difícil para a criança não querer imitá-los. Por isso, será necessário rever suas próprias condutas e hábitos, sair do automático. .

Além disso, a criança longe de eletrônicos, certamente, estará mais “presente” na casa; sabemos que uma criança olhando telas não incomoda e fica quietinha, o mesmo não acontece enquanto brincam. Pense que, sem telas, elas exigirão mais atenção e  vontade de estar com os pais, seja para brincar, seja para reclamar. Será uma alta demanda para os adultos e é preciso muita honestidade consigo mesmo para entender qual é o limite de cada um, ou seja, não apenas o quanto você quer, mas o quanto pode arcar com esta decisão. A resposta, como sempre, será individual e não há pedagogia que sustente. Como dito, as memórias positivas sobre a TV também geram conflito internos nos pais, porque mesmo que saibam o quanto os dispositivos possam ser prejudiciais, lembram de suas infâncias repletas de desenhos; nessa hora podem se questionam se faz mesmo tão mal assim…

E é este o desafio da parentalidade, buscar a consciência sobre si mesmo, de suas limitações e tomar partido disso para a solução dos desafios com nossos próprios filhos. Este exercício é fundamental nas tomadas de decisões importantes como esta, onde a busca por validação da decisão tomada pelos pais, será colocada à prova. A criança buscará limites e respostas. Ainda, a mudança impacta na dinâmica familiar, portanto nada mais justo que a decisão vir de ambos pais. O apoio de todos envolvidos na educação impactará diretamente o sucesso deste projeto.

Analise o contexto atual familiar, tente enumerar o potencial de perdas e ganhos, e se achar que não é o momento, adie a decisão ou pondere um equilíbrio. A decisão exige um olhar para dentro de si, observar qual o tamanho da nossa própria força de vontade. Não se trata de apenas tirar eletrônicos dos filhos, trata-se de, juntos, empreenderem um novo estilo de vida, que exigirá, também, que o próprio adulto reveja seus hábitos. Muitas vezes, nesta análise, descobre-se que faltam forças para resistir à sedução do mundo virtual. E ter coragem de reconhecer isso é ganhar consciência sobre si mesmo, autoconhecer-se, objetivo da Parentalidade Essencial. Seja qual for a decisão, se ela partir deste lugar de certeza, que vem do coração. Ali, você encontrará argumentos e força para colocar tudo em prática. E se optar em não mudar agora, tenha paciência, não se cobre tanto ao exigir posturas as quais ainda não se encontra preparado. Neste caso, busque recursos para mudar a situação no futuro.

Lembre-se que não existem regras, a educação é um processo de aprendizagem para todos os envolvidos. Com o questionamento sobre a decisão de eliminar ou não os eletrônicos da vida dos filhos, os pais lidarão com suas questões pessoais e, só nesse exercício, a criança também se beneficiará. Lidar com as angústias, culpas e frustrações diante da impossibilidade de fazer algo que desejamos, mas ainda não somos capazes, é uma forma de mostrar aos filhos que somos humanos, portanto, passíveis de falhas. A oportunidade de mostrar-lhes que estamos em busca de desenvolvimento pessoal tem enorme valor em sua formação. A melhor decisão é aquela que podemos fazer naquele momento, e não existe certo ou errado, apenas a decisão possível.

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