Soul Camila

Espírito

Tempo de leitura: 7 min

Uma escrita, muitas formas de consumi-la.

Espírito
Eu leio para você…

A morte não é um fim; tampouco, o nascimento, um começo. O cultivo da espiritualidade não é um preparo para uma vida após a morte e sim, a compreensão de que a vida terrena é apenas uma continuação de uma vida espiritual, uma vida que existe antes dos nossos vários nascimentos na Terra. 

Aqui, somos seres individuais, para isso, foi nos dado um corpo – onde cada ser humano terá o seu para caminhar e cuidar durante a sua  existência. A partir dele, executamos a vida, onde ele será nosso veículo para a nossa existência terrena.  Mas, no limite, este corpo apenas reflete o espírito absoluto em algo físico individual. Mas nosso espírito está além dele, aliás, fora das leis do mundo físico. O espírito não precisa de um corpo que opere sob leis terrenas. Recebemos um corpo, crescemos, construímos nossa arquitetura mental e universo emocional e, pela ação da mente, aprendemos a nos identificar com nosso corpo até que, por volta dos três anos, nos auto-referimos pela palavrinha eu. Você já pensou que ninguém pode ser chamado de eu por outro que não seja eu mesmo.

 Mas somos mais que este corpo, obedecendo às leis de crescimento, amadurecimento e morte. O corpo morre, mas o espírito continua. O eu é a junção de corpo, alma e espírito, e o problema do ser humano é reduzir sua totalidade ao seu corpo físico. Doentes dizemos, “eu estou doente”, na verdade, quem adoece é o corpo, o eu é muito mais do que apenas essa porção física; esta sim é capaz de ficar doente e morrer, pois, obedece à curva de vitalidade. Mas o eu obedece a curva da consciência; e esta, é imortal.

Outra forma de identificação que comumente fazemos com nossa porção física é usada quando dizemos “meu corpo está doente”. Segundo o mestre iogue, Osnir Cuggenota, “Se é meu, não sou eu”. O que observo é fruto do trabalho do meu aparato cognitivo. Assim, vivemos sendo observadores e criando realidades. Olho objetos e coisas fora de mim e digo que são meus. Isso significa que aquilo que eu consigo observar, inclusive meu corpo, é meu, mas não sou eu. O eu é feito de camadas –corpo, espírito e alma – e algumas delas não vemos com órgãos sensoriais. Se olho meu corpo e acho que ele sou eu, perco a minha dimensão humana completa. Obviamente, estamos identificados com o nosso corpo, inclusive, devemos estar para que possamos amar e cuidá-lo para viver o máximo possível de forma plena e desenvolver nossa alma. Mas, no caminho da consciência, temos que, cada vez mais, perder a completa identificação com nossa camada material e abrir a percepção para incluir o sutil em nossa existência.

O budismo e linhas hinduístas, em geral, falam que o sofrimento, e tudo que nos impede de viver a felicidade, está na ignorância e no apego. Normalmente, levamos esse conceito para nossa vida, tentando não nos apegar a coisas e objetos materiais, mas nos esquecemos de que o apego ao corpo é a própria ignorância. Somos uma coisa muito completa, da qual desconhecemos a metade. A ignorância reside em não reconhecer a nossa verdadeira natureza, que são essas outras camadas à parte. À medida que passamos a vida, desde a infância, cultivando apenas a relação com o corpo, conhecemos apenas esta camada, e passamos a chamar o corpo de eu.

Essa confusão está intrinsecamente relacionada aos papéis que exercemos ao longo da vida, como filhos, pais, mães, funcionários, chefes, maridos, esposas… nos identificamos com o papel que exercemos. Quando perguntam “Quem é você?”, é comum respondermos a esta pergunta com frases como: “sou advogado (a), médico (a), empresária, mãe (pai), professor (a), do lar. Perceba a dificuldade em nos apresentarmos sem colocar nossas profissões como nosso eu.  Isso pode fazer parte da cultura e não é um problema, a não ser quando passo a acreditar que sou apenas aquilo. Essa, aliás, é a causa do sofrimento, esse apego aos papéis, como se, sem eles, não fôssemos alguém, não pudéssemos sobreviver sem tal posse, aí está a base da ganância; o desejo de possuir começa nesse nível.

O caminho da libertação, moksa para iogues, passa por compreender que o corpo e os papéis que exercemos através dele, morrem. E à medida que não exerço mais minhas habilidades, a vida, que é feita de movimento, deixa de existir. No entanto, o espírito não precisa de corpo para existir.

Um conceito que demorei para introjetar é o de que o corpo não é vivo; se fosse, não morreria. A camada que carrega a vida efetivamente não morre. Paramahansa Yogananda, guru indiano, considerado um dos maiores emissários da antiga filosofia da Índia para o Ocidente, dizia para não acreditar que é o alimento que nos mantém vivos. Se isso fosse verdade, bastaria darmos comida ao cadáver e ele reviveria. Yogananda está falando dessa vida que sustenta o corpo, essa vida que emprestamos de uma fonte maior, para eles, Brahma, para nós, podemos simplesmente chamar de Deus. 

Estamos aqui em uma tarefa coletiva de desenvolvimento humano, em que cada um de nós, individualmente, faz sua história, aprende, cresce e pode evoluir dentro de suas limitações. Não se trata de falar que alguém faz mal nesta vida e que vai pagar na próxima, isso é falar de reencarnação de forma reducionista. Infelizmente, as religiões colocaram essa visão recortada em cima da questão do carma, que é uma questão tão mais ampla. Carma é a linha lógica para entender nossa vida aqui na Terra, considerando que há uma inteligência maior da qual fazemos parte e à qual queremos nos assemelhar. Por isso, escolhemos aprender e passar por experiências que nos façam alcançá-la. A teoria do carma não fala em punição, castigo ou inferno; é física – toda ação gera uma reação. Assim, podemos entender os desafios da nossa vida e ter compaixão pelos caminhos dos outros, que às vezes trilham caminhos mais ou menos difíceis que os nossos, mas, no limite, estamos todos caminhando. Cada um de nós está colhendo frutos de algo que plantou em um momento, e isso pode ser quebrado a partir do reconhecimento de que todos somos fruto de uma única fonte criadora, vivendo momentos de evolução diferentes.

A definição sobre como vamos viver neste plano faz parte de condicionamentos individuais que acumulamos ao longo de existências. Estes condicionamentos são os geram nossos desejos de prazer; mas o prazer puramente terreno é algo que só pode ser realizado no plano material. Portanto, necessitamos de um corpo para satisfazê-los. Nesse sentido, quanto mais apegados aos prazeres terrenos, mais ligados ao nosso corpo. E são esses condicionamentos que fazem nossas camadas sutis precisarem de camadas densas para se realizar, assim, ganhamos um corpo para nosso espíriro existir aqui na Terra

O mais importante para nossa evolução é entendermos que somos parte da natureza perfeita e verdadeira. Portanto, nossa verdadeira natureza não evolui. O que fazemos aqui é trabalharmos nossas camadas emocionais e mentais a tal ponto de refinamento, que entendamos que nós não somos apenas uma mente em um corpo; somos, com isso, pedaço da essência divina, somos Brahma, Deus.

O fato de morrer não significa evolução; senão, bastaria o assassino morrer para se libertar dos efeitos de seus atos. Evolução depende da nossa intenção e das escolhas que fazemos aqui na Terra, enquanto encarnados em um corpo físico. Afinal, ele que nos permite experiências e relacionamentos, que refinam nossas almas e nos permite exercitar qualidades morais.

“A vida só pode ser entendida se a contemplarmos em sua totalidade, sem separar apenas um curto período de tempo que decorre entre o nascimento e a morte. Pois esse período depende, por sua vez, intimamente do que se passou na inatalidade, no mundo pré-natal, puramente espiritual. Como todo nosso ser, somos dependentes do que se passou anteriormente no mundo espiritual.”

Rudolf Steiner


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