A palavra “líder” significa guiar, conduzir. Já o substantivo “liderança”, formado dessa raiz, refere-se a capacidade ou ação de ser líder, habilidade de guiar, influenciar ou inspirar um grupo de pessoas que desejam alcançar objetivos comuns. Apesar de comumente estar associada ao universo corporativo e à política, a capacidade de liderança é um atributo valorizado em outras áreas, como no esporte, educação, família e, principalmente, em nossa vida pessoal.
É comum achar que a liderança é algo que nasce pronto dentro de uma pessoa, algo intrínseco e possível apenas para algumas pessoas. Mas será que ser líder é uma capacidade nata ou pode ser desenvolvida? Penso que as duas coisas. Algumas pessoas carregam em si o dom da palavra ou postura que, naturalmente, inspira e guia outros. Estas pessoas normalmente acabam, de maneira consciente ou inconsciente, tomando para si posições de liderança em todas áreas por onde transitam. Outras pessoas não carregam tal facilidade, mas a vida as chama para protagonizar esse papel; nesse momento, elas se veem impelidas a aprender como exercê-lo. Em ambos os casos, aquele que deseja ser um bom líder precisará sempre se autodesenvolver para alcançar sucesso em sua tarefa.
No universo corporativo, as qualidades do líder fazem parte das chamadas Soft Skills, que na tradução literal significa “habilidades macias”, mas que, na verdade, significam habilidades comportamentais, interpessoais ou socioemocionais. Ou seja, competências não técnicas e não específicas de uma área de conhecimento. Elas envolvem a forma como as pessoas interagem, comunicam-se e se relacionam umas com as outras. No mundo dos negócios, as Soft Skills são essenciais para o seu sucesso, mas vemos que elas também são para o sucesso na vida pessoal de qualquer pessoa.
A boa notícia é que, por se tratar de uma habilidade, é possível se autodesenvolver para alcançá-la. Mas isso requer um passo anterior: conhecer a si mesmo, autoconhecer-se. Daí, o tema do autoconhecimento entra como premissa para uma boa liderança. O autoconhecimento desbloqueia o potencial de liderar nossas próprias vidas e acredito que essa liderança seja a primeira a ser exercida para aquele que pretende ser um bom líder. Depois de conquistar seu próprio universo, uma pessoa estará realmente apta para trazer evolução de uma equipe ou de uma organização. Caso contrário, conforme aumentam as dificuldades em sua gestão de liderança, corre-se o risco de perder o controle sobre seu próprio universo interno.
É ao mergulhar em suas próprias emoções e no “universo do sentir” que nos deparamos com nossas limitações e, também, com nossas virtudes; e é nesse encontro que podemos entender nossas forças e nossas fragilidades, potencializando as primeiras e fortalecendo as segundas. Ainda, nesse trabalho interior, o ego – o maior inimigo, não apenas do líder mas de todo ser humano – será confrontado. Sair de si mesmo e ir em direção ao outro, exercendo a empatia, seja talvez a capacidade mais “soft”, mais sofisticada e mais difícil de aprendermos. Na empatia, nos sintonizamos com alguém e estabelecemos com ela uma conexão verdadeira, nesse jogo, somos capazes de sentir a necessidade da outra pessoa e, ainda que discordemos, conseguimos ter uma atitude respeitosa diante disso, exercendo a famosa compaixão.
Até poucos anos atrás, as palavras compaixão, autoconhecimento, e empatia, estavam completamente apartadas do universo corporativo. Mas isso tem mudado e parece ser para valer. A pandemia acelerou esse processo quando as empresas entraram dentro da casa de seus funcionários. Gestores foram convocados a compreender âmbitos da vida de seus funcionários que ficavam apartados do trabalho e tiveram que tomar decisões levando em conta o lado humano, que até então era praticamente cindido do profissional. No máximo, a empresa possuía um RH que cuidava daquilo que “não cabia” na conversa de business. Ainda, as recorrentes crises de burnout – quando um funcionário ou, principalmente, um líder sobrecarregado, não suporta a pressão e implode, primeiro atingindo sua própria equipe pelo seu comportamento irritadiço, rude ou ameaçador; depois, auto implodindo-se, destruindo a si mesmo – também derrubaram as fronteiras que separavam universos.
Mas, afinal, o que é preciso ter para ser um bom líder? Dentre as atribuições dadas a um líder estão:
- Capacidade de tomada de decisão;
- Gestão Emocional;
- Comunicação clara;
- Desenvolvimento de senso de equipe;
- Gerar senso de pertencimento e confiança na equipe;
- Empatia;
- Capacidade de resolução de conflitos.
Interessante observar que essa lista toda sempre coube dentro do autoconhecimento, mas que só agora isso tem ficado mais evidente. Ao estar consciente de seus valores, crenças, limitações e potências, o líder se torna capaz de alinhar escolhas pessoais aos princípios da empresa ou da equipe sob sua liderança e construir uma jornada segura e clara para seus liderados. Essa integridade e coerência são percebidas pela equipe, que responde com segurança, engajamento e obtêm uma visão compartilhada. E conforme aumenta a percepção sobre si mesmo, uma nova habilidade também é conquistada: adaptabilidade. O ser humano é o único ser capaz de se adaptar para viver em qualquer habitat. Não vemos girafas no polo norte e nem ursos polares na África, por exemplo, mas vemos a espécie homo sapiens em ambos.
Que capacidade é essa que nos permite estar em diversos territórios senão a capacidade de adaptar-se à diversidade?
Na liderança, o líder é convocado a olhar cenários que mudam em velocidade às vezes caótica e precisa não apenas cuidar de seu bem-estar, mas de todos sob seu comando e isso está intimamente ligado ao fato de conhecer tanto a si próprio, que compreende seus próprios limites. Somente quando nos conhecemos nos recônditos do nosso ser, sabemos diferenciar aquilo que é possível abrir mão em prol da equipe e dos negócios, ou seja, valores negociáveis, daqueles que não podemos deixar de seguir, aquilo que é inegociável em nossa vida pessoal e que, caso seguíssemos, estaríamos indo contra nossa verdadeira essência.
O líder que conhece a si próprio sabe que passar por cima de sua verdade tem um preço alto.
Penso que o burnout seja exatamente reflexo de quando passamos tantas vezes por cima de valores que nos são tão altos, que uma hora auto implodimos. Passar meses longe da família em prol do bem da empresa, passar madrugadas sem dormir, alimentar-se ou exercitar-se para cumprir a meta, sair de casa tão cedo e chegar tão tarde que não se tem tempo de ver o filho crescer. Todos esses podem ser valores caros demais para se passar por cima. Se esses valores não estão na consciência, o corpo denunciará, mais cedo ou mais tarde.
Muitos líderes conseguem fazer isso por um tempo. Tomam decisões que, muitas vezes, ferem, de maneira inconsciente, valores muito importantes para si mesmos. Por desconhecê-los, eles não se dão conta na hora, e vemos apenas a ponta desse iceberg nas crises de burnout ou quando um líder nato joga a toalha e, simplesmente, abandona sua carreira antes de explodir.
Quando vejo casos como esse, de pessoas que eram muito boas no que faziam, que possuíam dom nato para liderar, abandonar tudo e seguir nova jornada de trabalho, penso se o autoconhecimento as teria impedido de desistir. É bastante comum ouvirmos histórias de pessoas do mundo corporativo que cansaram dele e foram para caminhos opostos. O universo do autoconhecimento está cheio de ex-advogados, engenheiros, gerentes e excelentes ex -líderes. Quando olhamos tais pessoas, nem conseguimos imaginá-las vestindo ternos e tailleurs – estão completamente desconectadas do universo de onde vieram. O famoso caso do líder da multinacional por 30 anos que se torna terapeuta, da engenheira que se torna professora de Yoga, da chefe de equipe de 200 pessoas que se isola e resolve trabalhar com retiros de autoconhecimento. Mas, se olharmos bem, ainda podemos ver a capacidade de liderança presente em seu jeito de falar e agir. Isso porque liderar não está ligado a uma profissão, mas a capacidade de gerir a própria vida.
Quando ouço histórias de pessoas talentosas que deixaram o mundo corporativo, sempre enxergo um ato de coragem e ousadia – mas não me surpreendo, todo líder tem essa capacidade nata – mas nunca deixo de me questionar se esse era mesmo o caminho. Se tivessem investido o mesmo tempo que investiram na empresa, em si mesmos, estariam desistindo do universo corporativo ou teriam encontrado o equilíbrio perfeito? Penso que o universo corporativo apenas perde quando pessoas com esse potencial desistem dele e migram para áreas exclusivamente holísticas e aumentam a separação entre autoconhecimento e organizações. O universo dos negócios precisa de bons líderes, que se conheçam a si mesmos e que, ao fazerem isso, iluminem o caminho de todos que estão sob sua gestão e liderança.
Nessa troca, a organização, composta de pessoas e das relações que acontecem nela, ganha, e pessoas e empresas evoluem. O autoconhecimento do líder transcende resultados tangíveis e visíveis. O bom líder carrega a equipe em um jogo invisível, onde ele se vê espelhado em sua equipe e a equipe se inspira na figura que segue. Se todas as empresas tiverem um olhar para essa dinâmica, não apenas pessoas e empresas evoluem, mas nosso planeta.
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